segunda-feira, 16 de março de 2009

INÍCIO

Ao acessar este blog você pode saber algo mais sobre o salão, através do seguinte texto:

1. O processo imigratório na história do Brasil entre o final do século XIX e início do século XX.

2. A tradição de integrantes da família Pasculli executantes na profissão de barbeiro.

3. Outras Histórias.

4. Referência Bibliográfica.

5. Sessão de fotos.

1 - O processo imigratório na história do Brasil entre o final do século XIX e início do século XX.

Economia e Cultura estão sempre juntas sendo que a cisão das duas serve para distinguir as atividades, como que Cultura é o costume de um povo: Trabalho, comida, vestimenta, religião, música, livros, etc, A Economia São as formas de moeda através das especulações: financeira, imobiliária, do trabalho, dos recursos naturais, e dos sentimentos da vida, etc. No entanto, economia é cultura e cultura é economia, por exemplo, quando que um determinado tipo de trabalho é um tradicional costume que serve para gerar comida, aí a economia anda na frente, pois ela busca recursos para gerar comida e manutenção de sustento para o povo. Nem só de pão vive o ser humano, porém, quando a barriga doe não há religião nem entretenimento que alivia a dor, por isso um dos motivos das guerras acontecidas na história da humanidade é a falta de espaço não só o físico, mas também o financeiro para o cultivo do trabalho que gera comida para a grande maioria do povo. Por isso a economia anda na frente como guia de todos os padrões sociais, pois quando um determinado povo tem o poder econômico e bélico, este povo impõe suas formas de cultura sobre outro povo com o objetivo de escravizá-lo e extrair de seu território os recursos naturais.
Pensando em trabalho é interessante observar as profissões, e nelas como base para a formação e o funcionamento da atual sociedade a qual vivemos. Vivemos numa sociedade econômica industrial capitalista em que o excedente, o desperdício e a crise financeira são realizações de sustentação para esse tipo de economia, esse tipo de sociedade nasce na Europa mais especificamente na Inglaterra por volta dos anos de 1750 e logo em seguida fortalece nos E.U.A., como a Europa detêm o poder bélico e financeiro ela dita todas as normas de Cultura Ocidental e tão logo esse tipo de poder se estende também para os E.U.A.. Os acontecimentos que o mundo estava passando em todos os complexos: sócio-político e econômico depois da instalação da indústria junto às teorias dos cientistas, inventores, filósofos e políticos entre todas as áreas de estudos, o fortalecimento dessa sociedade foi se adequando.
Próximo aos anos entre 1850 a 1930, mesmo que já havia uma camada de pessoas brancas residentes no Brasil, neste período foi instalada na política brasileira uma lei de interesse para atrair imigrantes brancos, a fim de povoar o país para que pudesse haver casamentos entre os novos habitantes brasileiros (imigrantes brancos), mais a população negra brasileira que já estava no país, o interesse dessa política era de cultivar a miscigenação para embranquecer a população brasileira num futuro próximo, e que os imigrantes pudessem trazer para o país suas culturas[1].
Segundo os registros oficiais do Brasil, fica evidente o processo imigratório em nosso país com a chegada de estrangeiros em números oscilantes, em determinadas décadas, para determinadas regiões brasileiras, e de determinadas nacionalidades diferentes, por volta de 1850 e se intensificando a partir de 1880 até 1930. Com os efeitos da segunda guerra mundial, esse processo se estendeu até 1950 já em menos números[2]. Os imigrantes se espalharam pelo país, porém o grande número de colônias, bairros e até cidades se formaram nas regiões sul e sudeste do Brasil, com isso a descendência do povo brasileiro resulta nos dias atuais de duas ou mais etnias diferentes.
A formação da cidade de Poços de Caldas está nesse contexto histórico, pois a data de instituição da cidade é em novembro de 1872, o processo imigratório e mais a elevada camada de famílias negras que já viviam aqui, e outras famílias recém saídas da lavoura de cidades e fazendas vizinhas de Poços de Caldas, pois vinham buscar vida nova ao crescimento da cidade que estava formando, entretanto, a camada de italianos é bem elevada.
A nível municipal, restringindo o assunto sobre profissão, e mais ainda à arte capilar, (profissão de barbeiro) é importante destacar um ponto forte que está claro nessa profissão na história de Poços de Caldas, a influência dos imigrantes italianos nas barbearias[3]. Alguns nomes como:
Ângelo Moretto, Antonio e Giacomo Pasculli, Antonio Virgas & Cia, Carlos Eurico, Fausto Venafro, Irmãos Borguetti, José e Giuseppe Hipólito, Julio Del Sarti & Irmão, Pietro Del Sarto, Raffaele Sarti, Pantaleão Stanziola, Vicente Gallize, Felice Galeazzi, de todos o único da época que não leva nome italiano é Joaquim Campos.
O objetivo de atrair os imigrantes seria um povo cuja cultura se assemelhasse com a cultura do povo negro existente no território brasileiro, embora o termo identidade nacional ainda estava nascendo com as leis outorgadas no decorrer do século XIX desde a vinda da família Real com Dom João VI em 1808, a criação do Senado e a independência do Brasil, depois a lei do Sexagenário em 1865 que garantia aos escravos acima dos 60 anos de idade a alforria, a lei do Ventre Livre em 1871 que garantia aos filhos de escravos nascidos no Brasil nascerem livres, e a lei da abolição em 13/05/1888. No ano seguinte a Proclamação da República em que a preocupação maior dos governantes era de unificar as províncias em uma só federação, antes que ocorressem as independências de cada província quando eram ameaçadores e reais os movimentos separatistas naquele período de Brasil colônia.
Então, era necessário criar o conceito de identidade nacional, dar nome e título de cidadão ao povo aglomerado nesse território justificando junto com nome de país Brasil. Devido o racismo não seria dado o título de brasileiro somente aos negros, com chances de ocuparem os espaços como classe dominante em todas as esferas políticas num futuro próximo, portanto, era preciso atrair brancos com culturas apropriadas ao costume mais parecido com os negros, tanto na zona rural que era enorme, quanto na zona urbana ainda menor de um país que estava nascendo, nem chineses nem outros brancos europeus assemelhassem tanto com a cultura afro-brasileira quanto os italianos.
Final do século XIX as famílias italianas viviam em condições de miséria, fome, falta de trabalho e ameaçadas de morte sobre uma terra européia esfacelada em crise e próspera de duas guerras mundiais, a semelhança do italiano com o negro brasileiro é muito nítida na luta pela sobrevivência num costume prático e natural, que é a troca de favor para saciar uma das necessidades básica que é a Fome. Por exemplo, trocar 1 maço de couve, cebolinha, 3 pés de alface plantado na horta de casa por meio quilo de milho para tratar das galinhas, ou ovos, ou pés de porco, seja da roça para o comércio numa cidade interiorana, seja no contato entre os comerciantes do dia-a-dia que necessitam se comunicar e trocar mercadorias, e ou, mão de obras por dívidas entremeadas de dinheiro e favores do cotidiano, além do convívio nas cidades grandes em cortiços.
Enfim, a coesão entre o negro brasileiro e o italiano é semelhante ao convívio entre dois irmãos que brigam a vida toda, mas estão sempre juntos numa eterna união pelo contato do ódio e do amor, mesmo que haja o existente racismo entre os povos, porém o racismo não alcança o convívio do cotidiano dessa união e a miscigenação amorosa.
Há inúmeras citações de trocas de favores do cotidiano, as quais as relações que convivemos diariamente são chamadas de micro. Das relações macro que estendem a nível nacional, é muito peculiar à cultura religiosa européia dominante judaico cristã num entrelaçamento com a cultura religiosa africana, e os italianos em geral ou adoram todos os santos, ou, por mais ateus e céticos que um ou outro seja, respeitam não pelo sentimento de medo, mas pelo sentimento emotivo. O povo italiano proveniente de uma cultura religiosa católica, se “deu bem” num país tão católico formado por negros descendentes da religião africana, centro espírita, que veneram através de um costume forçado ao longo dos séculos de escravidão os santos da igreja católica.
Além da religião também outra cultura fortíssima como o futebol, desde quando foi criada essa modalidade esportiva e logo trazida para o Brasil rapidamente foi o esporte número 1 no país, embora já foi esporte para a elite e negros não podiam jogar futebol, quando começaram a praticar foi o mesmo que na música já nasceram professores. Dentre a lista dos países mais populosos do mundo o Brasil é o país que sempre praticou futebol, e os países que sempre praticaram futebol têm a população do tamanho de um estado brasileiro, quer dizer, nem se compara a quantidade de jogadores brasileiros inscritos nas ligas de futebol amador e profissional, com as ligas de outros países tradicionais na prática de futebol. O acasalamento foi perfeito do italiano apaixonado por futebol com a peculiaridade do negro brasileiro para a habilidade futebolística.
Quando esse território estava se formando como país para ter a identidade nacional brasileira, entre o final do século XIX e as primeiras décadas do século XX, a classe dominante desejava formar um povo miscigenado e embranquecido nas próximas décadas, também desejavam naquela época ter um povo branco trabalhando e servindo-lhes nos mais requintados teatros e hotéis, e toda a formação estratificada da nova sociedade brasileira até na mais baixa camada social. O italiano estava propício a esse costume, porque ele era branco, pobre com necessidade de trabalhar possuidor de um conhecimento da mão de obra técnica que são as profissões liberais, principalmente porque somavam para o crescimento e a sustentação da economia capitalista numa sociedade industrial recém-nascida da época para as condições ideais de formar a classe média. Aqueles italianos um pouco mais abonados investiram em comércios e indústrias, e aqueles italianos sem dinheiro e sem profissão foram ocupar os espaços na roça reforçando mais ainda o crescimento da economia capitalista que cresce com os lucros, ou seja, mão de obra assalariada recebe salário para comprar os produtos expostos no mercado, e não a mão de obra escrava que trabalha e não tem salário para comprar mercadorias. Além de trazer suas culturas o imigrante não vinha sozinho, ele trouxe consigo sua família reforçando o conceito da família núcleo: Papai, mamãe e filho, totalmente próprio de uma instituição básica para os moldes da sociedade industrial capitalista da época, dentro dos padrões da moral para a formação do caráter do indivíduo. Mas, não se deve considerar a exclusão e a marginalização sobre os negros culpando os italianos, porque essa classe de branco tanto está no mesmo barco quanto os negros e foram usados perante suas necessidades de sobrevivência, para ocupar os espaços como escravos trabalhadores da sociedade econômica industrial política capitalista.
Os imigrantes estabeleceram no sul e sudeste do Brasil devido a temperatura climática ser semelhante à Europa, a maioria sonhava ajuntar um bom pecúlio relativo ao seu sonho pessoal e voltar para Itália, mas no fundo todos sabiam que realmente era impossível voltar para uma terra flagelada num caldeirão fervendo para as iminentes 2 grandes guerras.
[1] Caio Prado Júnior. Formação do Brasil Contemporâneo.
[2] Warren Dean. Industrialização de São Paulo ( 1880 – 1945 ).
[3] Outros Lançamentos dos Impostos de Indústrias e Profissões, Vida Social.

2 - A tradição de integrantes da família Pasculli executantes na profissão de barbeiro.

A história da família Pasculli como executantes na profissão de barbeiro começou na Itália com o barbeiro Genaro, chamado de Maestro Genaro, pai de Giacomo. Giacomo Pasculli, barbeiro (1871-1947), e sua esposa Domingas Bucinni migram da Itália para o Brasil em 1895, aportaram em Santos e seguiram para Santa Rita do Passa Quatro onde ele trabalhou de lavrador por alguns meses, depois mudaram para Niterói onde trabalhou de barbeiro e algum tempo depois foi para São Paulo. Uma das histórias contadas de pai para filho, “Tuli” comenta:
__Quando meu avô Giacomo foi para Niterói ele esteve numa barbearia para pedir trabalho e o dono do salão perguntou a ele se ele era oficial, ele respondeu que oficciale é do exército ele era barbeiro, ali ele conseguiu uma cadeira para trabalhar. Teve um dia que chegou um freguês na barbearia com uma enorme barba e ele queria cortar a barba estilo inglesa, bem volumosa no rosto e mais curta no queixo, os barbeiros indicaram o Giacomo, como ele era o barbeiro novato, o freguês sentou na cadeira e ele começou a aparar a barba daquele senhor, era só tesourada e pente que corria na barba comprida que estava até o peito, os pêlos caíam para todo lado, os barbeiros ficaram preocupados dele estar cortando muito porque era uma barba com uns seis meses sem cortar, terminado o serviço o freguês pagou e foi embora sem tecer comentário, no outro dia aquele senhor voltou lá para agradecer dizendo, é essa barba que faz tempo que eu queria e deu uma gorjeta ao Giacomo. Meu pai dizia também que nessa época quando ele morou em Niterói não tinha rede esgoto, assim em algumas ruas da cidade todos os dias de manhã as pessoas deixavam nas portas de suas casas pequenos barris contendo as fezes do dia anterior, para que o coletor passasse e pegasse para levar à um local apropriado como faz a coleta de lixo, esses barris eram transportados de carroça. Além das histórias contadas de pai para filho, também foram as formas de aprendizado da profissão que passou de pai para filho junto com o ambiente e a freguesia.
Giacomo e Domingas tiveram quatro filhos: Francisco nascido na Itália, Januário nascido em Niterói, Antonieta nascida em Sã Paulo e Joana nascida em Poços de Caldas. Dos quatro filhos, Francisco (1895-1990), seguiu a profissão de barbeiro, casou com Itália Incrocci que tiveram dez filhos: Delma, Yone, Francisco Filho, Giacomo Neto, Januário Sobrinho, Plínio, Emerson, Aldo, Domingas e Ernani todos nascidos em Poços.
Numa entrevista realizada com a repórter Celeste Calil para o jornal Diário de Poços de Caldas em maio de 1987, Francisco narrou:
__“Meu pai chegou em Poços em 1900 e formou a barbearia na Rua Junqueiras nº 05, hoje nº 567, em 1915 ele comprou na Casa Fachada da Rua Direita em São Paulo, com o valor de quinhentos e cinqüenta mil réis cada uma, cinco cadeiras giratórias de barbeiro de dois jogos importadas dos E.U.A., diz-se que a cadeira é de dois jogos, porque um jogo é quando ela está na posição de sentado, o outro jogo com o mecanismo de uma alavanca ela é reclinada em posição de semileito, ele ainda acrescentou: Comecei a trabalhar com meu pai em 1913 e segui a profissão até 1972, nessa barbearia foram nossos fregueses: a família inteira do Coronel Agostinho Junqueira, a família do Dr. Mário Mourão, a família Vivas, a família Monteiro de Bom Sucesso, dona Sinhá casada com o Dr. Pedro Sanches, dona “Cocota” que viveu até os cem anos casada com o Major José Afonso Barros Cobra. O Dr. Pedro Sanches que residiu do lado da Igreja Santo Antonio numa casa que o portão tem uma placa com o seu nome hoje é o atual Hotel Santos, Padre Henry Mothon veio para o Brasil e foi trazido para esta cidade pelo pai do Dr, David Ottoni em 1906, na esquina do antigo Imperial hotel atual banco Itaú os políticos se reuniam para fazer discursos, o local foi apelidado pelo povo de “Praça das Promessas”, o prefeito Juscelino Barbosa fez o traçado da cidade e plantou eucaliptos na av. João Pinheiro em 1908 que foram retiradas em 1958 com o reflorestamento das atuais, o senador Francisco Escobar prefeito de poços em 1909 construiu o Poço Zootécnico em 1921 que passou a ser o Country Club e atual parque municipal, Carlos Pinheiro Chagas, João Moreira Salles e o Dr. Aristides Melo diretor das Thermas foram à Europa visitar as estações balneárias e organizaram as Thermas de Poços, Santos Dumont vinha muito para Poços”.
No dia 24 de junho de 1984 foi realizada uma cerimônia no Palace Hotel em homenagem aos primeiros italianos que chegaram em Poços, com a presença do cônsul italiano de B.H. Ricardo Manaro, na ocasião foram plantadas duas árvores na praça Afonso Junqueira em Homenagem ao Brasil e a Itália, da qual, participei representando um dos italianos mais velho ainda vivo, essa festa foi organizada por José Carlos Garutti secretário do S.O.S. “[1]
Dos dez filhos de Francisco quatro seguiram o ofício: Delma nascida em 1926 que trabalhou como manicure, pedicure e cabeleireira no Instituto de Beleza Pedro Sanches e posteriormente no Instituto do Palace Hotel, aposentou aos oitenta anos de idade no Instituto de Beleza Déa, na Rua Pernambuco, nº 664;
Januário Sobrinho, “Catuca” nascido em 1933 trabalhou com seu pai e mudou para São Paulo em 1956, onde trabalhou em alguns salões como empregado. A partir de 1962 formou seu o seu próprio salão e teve quatro salões com o nome de Phídias. Foi presidente do Sindicato Patronal de São Paulo, de (1972 a 1976); diretor da Federação do Comércio do Estado de S.P. (1973 a 1976); diretor do SEMAE, (1973 a 1976). Foi um dos precursores dos aditamentos da profissão de barbeiro para cabeleireiro na década de 1970. Em 1980 participou da fundação ASBRACA, Associação Brasileira de Cabeleireiros; (1976 a 1982) atuou como professor do SENAC, em aperfeiçoamento de cortes e especialização em fogo e a navalha. Foi influente em “abrir as portas” para maior comunicação entre barbeiros e cabeleireiros da América do Sul. Atualmente está em São Paulo já aposentado, entretanto ainda atende alguns clientes.
Aldo nascido em 1939 começou a trabalhar em 1954 no salão com seu pai, em 1960 foi para São Paulo trabalhar por dois anos, regressou à Poços e trabalhou no salão da família na Rua Junqueiras e lá permaneceu até o fechamento definitivo do salão entre 1988/89. Atualmente trabalha no salão Paris na Rua Barão do Campo Místico nº 8 - 3, o antigo endereço do salão Paris era na Rua Junqueiras ao lado do edifício Bauxita desde os anos de 1950 quando era do Ademar.
Ernani Augusto Pasculli, “Tuli”, (1943 – 2008) começou a trabalhar com seu pai em 1963 e permaneceu até o fechamento definitivo do salão, formou um salão em sua casa na Rua Barão do Campo Místico nº 298.
Continuando o oficio da família, Januário Sobrinho casou com Aída e tiveram dois filhos: Avilmar Pasculli “Mala”, nascido em 1952 iniciou na profissão de cabeleireiro em 1972 na Vila Mazzei, Zona Norte de SP. É um dos pioneiros a lançar o corte Pigmaleão, contemporâneo às técnicas de aditamentos de salão unissex que surgiram na profissão a partir da década de 1970, para fazer o penteado com escova e secador até o desuso do tradicional bobes. Em 1997 veio para Poços e trabalha atualmente no salão do “Tuli”.
Sua irmã Marcelene nascida em 1960 também aprendeu a profissão, porém exerce apenas como hobby.
Ernani Augusto casou com Silvia e tiveram dois filhos: Clayton e Ernani Filho. Ernani Pasculli Filho, “Melão”, nascido em 1976, começou a aprender a profissão em agosto de 1990 com o pai e trabalha atualmente no salão da Rua Barão do Campo Místico, nº 298.
Além de outros parentescos na profissão: O avô paterno da Silvia, Pedro de Melo Braga (1888-1966), nascido em São Gonçalo de Sapucaí, Minas Gerais, veio para Poços de Caldas em 1945. Seu salão era na Rua Assis Figueiredo, no local atual açougue Constância; E o primo Álvaro Luís Incrocci (1950 – 2007) trabalhou no salão do “Tuli” depois formou um salão em sua casa na Rua Major Luís José Dias, nº 168 Bairro da Vila Cruz onde trabalhou até falecer em 2007. O salão do “Tuli” recebeu o nome de Salão Primus, devido aos barbeiros primos da família que trabalharam lá.
É importante destacar que o Giacomo não foi o primeiro barbeiro de Poços, pois incluso no processo imigratório dos europeus que chegaram em Poços entre o final do século XIX e início do século XX, já havia outros barbeiros na cidade. Assim Mário Mourão descreve sendo o primeiro:
“O Avon era um francês velho, que chegou com reumatismo, sarou como tantos outros e resolveu ir ficando por aqui. Era barbeiro e negociante ambulante. Foi ele quem ensinou o Henrique Goffi e o José Rivas a escanhoar a cara do próximo”.[2]
O italiano Goffi chegou em Poços em 1892, ele é considerado o primeiro barbeiro de Poços a se estabelecer em salão com destino próprio de barbearia. Num outro livro sobre a história da cidade de Poços, Mário Seguso descreve:
“Durante o dia, Alfonso saía algumas vezes de sua lojinha para se revigorar com alguns goles de cachaça que também o esquentava, principalmente no inverno quando o frio lhe endurecia os dedos, justos aqueles que deveriam segurar as tachinhas. Ia também dar uma espiada na barbearia dos Pasculli para trocar com eles algumas palavras, mas vindo embora sem parar se por acaso enxergava dentro do estabelecimento, sentado na poltrona, uma das tantas personagens que regiam a orquestra político econômico local e social da cidade, como o Barão do Campo Místico, o coronel Agostinho, ou o Major Cobra, com os quais não se simpatizava. Aliás, ele pertencia à facção política contrária sendo um grande admirador do Dr. David Ottoni. Os Pasculli estavam sempre a parte de todos os últimos acontecimentos importantes ocorridos, ocorrendo ou que estavam para ocorrer, vindo a conhecer todas as notícias, entre uma pincelada de sabão e uma passada de navalha, enquanto os ilustres clientes conversavam. Alfonso pertencia à Societá Stella d’Itália”[3].
Subindo a Rua Assis Figueiredo do lado esquerdo de esquina com a Rua Expedicionários, funcionava uma escola de ensino primário na sociedade italiana onde negros e brancos estudavam juntos, quer dizer, a convivência entre as crianças já era preparada para acostumarem com as diferenças étnicas. Sem contar que a casa estava situada num local próximo aos bairros dos negros entre a Cascatinha e o bairro do Vai e Volta atual Rua Barão do Campo Místico.
[1] Diário de Poços de Caldas.
[2] Mário Mourão. Poços de Caldas Síntese Histórico Social.
[3] Mário Seguso. Os admiráveis italianos de Poços de Caldas.

3 - Outras Histórias.

TALCO FRANCÊS.

Aqueles barbeiros que formaram seus salões e junto com eles trouxeram ferramentas, alguns perfumes e loções. Nessa miscelânea cultural entre eles e os fregueses, criaram um ditado popular após o término de raspar a barba e perguntavam ao freguês o que passar no rosto para aliviar a pele recém escanhoada:
__“Arco ô tarco”, ou seja, álcool ou talco? E o freguês respondia:
__É “Vérva”, quer dizer, a água vélva. (a loção pós-barba).
Assim “Tuli” comentava:
__Meu avô quando veio da Itália trouxe um frasco de talco francês e um frasco de álcool italiano, a cada corte de cabelo concluído ao espanar os cabelos repicados, ele acostumou dizer “talquinho francês e alquinho italiano”. Nisso meu pai, eu e meu irmão Aldo acostumamos com o velho provérbio: “talquinho francês e alquinho italiano”, mas isso já era o nacional porque os produtos estrangeiros já haviam acabado há décadas. Continua “Tuli” - há uns tempos atrás eu estava no salão quando apontou na porta um casal, era o freguês que fora atendido sozinho há pouco mais de duas horas e retornou junto com a sua esposa no salão, lá da rua eu ouvia os dois conversando, pelo tom e o sentido de voz ele tentava convencê-la do talco e ela demonstrava não acreditar, queria conhecer o barbeiro e o talco. Os dois pararam na porta e antes de me cumprimentarem o freguês já foi logo dizendo:
__Fala para ela “Tuli” que é o “talquinho francês”, ela não está acreditando. Antes que eu falasse para a mulher que estava com um semblante desconfiada, porém num tom de voz calmo após cheirar o talco e conferir o mesmo perfume ela me perguntou:
__O talco do senhor é muito cheiroso, ele é francês mesmo? Com um sorriso sincero respondi:
__Não, eu comprei ali no supermercado Brasil, é costume desde meu avô a gente dizer “talquinho francês”. Tentando se demonstrar convencida, para disfarçar ela agradeceu a indicação do talco e pediu desculpas. Logo o casal deu as costas seguindo seu destino.



OUTRO adendo sobre Giacomo na obra de Mário Mourão é sobre o Bijou - Salão, o primeiro cinema onde é o atual edifício Bauxita, além de cinema era um longo salão de jogo. “À noite entre as pessoas de fora, na mesa da campista eram encontrados o Capitão Zeca, o Tenente Augusto e o Giacomo Pasculli, um conhecido e popular barbeiro que ia todas as noites buscar 20 mil réis, o que sempre conseguia acompanhando as cartas, que negavam. Quando a freguesia era de futuro e não havia lugar na mesma, o Nico chamava-o, corria-lhe os 20 mil réis e retirava-se o Giacomo todo satisfeito”.



OUTRA passagem citada sobre Giacomo foi num artigo “Galos e Galinhas” de Jurandir Ferreira no Jornal Diário de Poços de Caldas, em que o autor escreve sobre os enlaces e entraves da vida conjugal, para concluir seu texto ele comenta que na manhã do dia de seu casamento ele foi ao salão dos Pasculli para fazer a barba e o barbeiro Giacomo lhe passava algumas considerações sobre a vida matrimonial:
__Na minha terra – me disse ele - se da uma surra na mulher logo de entrada.
__ Sim, para se fazer respeitado, lhe disse eu.
__No! Per essere Amato! Quando não apanha, a esposa também acha que o homem não a ama bastante.





PRESENTE PARA A APOSENTADORIA.

Os antigos donos das lojas As Casas Pernambucanas, os dois irmãos Ludings, Asken e o Artur eram fregueses do meu pai, comenta “Tuli” e o Aldo, cada um pagava um salário mínimo no corte de cabelo.
Teve um dia que meu pai estava cortando o cabelo do Artur, no momento em que chegou o contador Azir Monteiro com o valor que meu pai deveria recolher de INPS (nome da época da instituição da previdência) para se aposentar, pois naquele ano o governo presidencial do Jânio Quadros criou a política econômica vigente da época, como uma anistia aos devedores da previdência que poderiam recolher todo o débito atrasado de uma só vez para se aposentarem. Quando o Azir apresentou as notas ao meu pai, ele quase caiu das pernas de susto devido o alto valor. Artur desencostou da cadeira com aquele sotaque alemão “aportuguesado” e disse:
__”Deixa me verr”. Enquanto meu pai choramingava pelo preço, Azir passou o papel ao alemão, ainda que sentado na beirada da cadeira, Artur levantou-se da cadeira calmamente, preencheu o cheque no valor da dívida e entregou ao meu pai dizendo:
__Vai se aposentar, você merece é de presente! No mesmo instante meu pai não sabia se recusava para fazer um pouco de mimo, se agradecia ou se desmaiava, meio abobalhado entregou o cheque ao contador que repassou os documentos todos ao INPS adquirindo o benefício da aposentadoria. O Artur nunca comentou nada do assunto para receber nem um centavo como ele mesmo disse, foi de presente.
Meu pai trabalhou até seus 77 anos de idade, o último cabelo que ele cortou inda trabalhando diariamente foi do neto do Artur.






MOTORISTA NAVALHA.

As piadas sobre o barbeiro como mau motorista já virou costume das pessoas usarem o termo de navalha, após algumas serem contadas nas rodas de bate-papo o Sr. Orandir, nascido e criado na cidade de São Paulo na década de 1930 comentou:
__Meu pai era italiano e barbeiro, sabe porque dizem que o mau motorista é considerado barbeiro, ou chamado de navalha? Pensando que viesse outra piada os integrantes na roda de conversas perguntaram com tom de voz cômico:
__Não, por que? Ele respondeu:
__Acontece que aqueles primeiros carros bem antigos o sistema de engrenagens era muito seco, no momento de mudar de marcha era preciso debrear duas vezes e mesmo assim tinha de ser num tempo exato, caso o motorista não fosse meticuloso e sensível em perceber o tempo exato que o motor exigia a marcha para a velocidade adequada, o câmbio dava demonstração de ter raspado e nisso essa raspada era comparada à raspada da navalha ao rosto do freguês quando o barbeiro estava cortando a barba, porque a navalha mal afiada não desliza perfeitamente, ela faz um barulhinho de raspagem.

DIVÃ.

Após tomar o tradicional café preto, somente café. Volto para a barbearia onde está meu pai cortando o cabelo de um velho freguês, sento em minha cadeira e percebo por alguns instantes a paz que reina tranqüilamente naquele ambiente, o silêncio só é quebrado pelos tac-tacs produzidos pelo movimento mecânico friccionado na tesoura. Olho para o reflexo do espelho e vejo dois senhores, como as marcas do tempo são implacáveis nas rugas e nos cabelos grisalhos, mas não se abatem por nenhum cansaço, pelo contrário carregam uma bagagem de experiência da vida.
Dali alguns instantes meu pai rompe o silêncio ao iniciar um assunto com o freguês, aos poucos a conversa vai se afirmando numa prosa que começa a ganhar força e equilíbrio, como aquela criança que está aprendendo a andar de bicicleta. Mais a vontade, aquele senhor, velho freguês há mais de vinte anos começa a comentar sobre seu filho de vinte e poucos anos de idade, sabendo que meu pai o conhece bem pois cortou-lhe o cabelo desde criança. Continua o freguês num desabafo tão íntimo e a vontade para seu barbeiro como um velho amigo ao narrar os desagrados que tem passado nos últimos meses com o filho, por motivos de uso de drogas e bebidas além do desrespeito com ele, o pai.
Quando meu pai passa o espanador no rosto e no pescoço do freguês para ir limpando os cabelos repicados, ao mesmo tempo vai tirando a capa como término do corte e ouvindo com toda a paciência o freguês que não para de desabafar, pois é um momento à vontade de ter um ombro amigo para chorar, esse freguês continua falando aproveita e pede para raspar sua barba. Olho para seu rosto e percebo que é uma barba de um dia, rotina que não é de seu costume estar barbeado diariamente.
A cadeira reclinada na posição de raspar a barba, meu pai corre o pincel ensaboando bem o rosto numa espuma branca como se fosse barba de papai Noel, assim como muitas crianças relembram quando vêem a espuma do sabão, a navalhete desliza suavemente numa pele quase sem braba nenhuma, em total silêncio como se eu não estivesse ali. Olho pelo reflexo do espelho e vejo os olhos daquele freguês lacrimejantes. O freguês volta a desabafar sobre seu filho, os problemas com álcool, drogas, polícia e desagrado a ele e sua esposa.
A todo ouvido e experiente no ramo, meu pai logo cita um outro exemplo de filho que dava o mesmo problema aos pais, porém já se regenerou parou com os vícios e está em paz com sua família.O freguês pára de falar quando começa a chegar outros fregueses cada um falando de assuntos diferentes: piadas, futebol, jogo de bichos, etc. Meu pai experiente e discreto percebe o momento da discrição daquele freguês em manter o assunto com intimidade somente ao seu barbeiro, que entra nos assuntos dos outros fregueses para não constranger aquele que está em sua cadeira sendo atendido. A barba que já está no final, o freguês se levanta da cadeira, paga pelo serviço, agradece duas vezes. Creio eu que uma vez de agradecimento é pelo trabalho e o outra vez é pela atenção. Ele se despede caminhando em passos lentos e demonstra estar com a cabeça mais leve.

A INFLUÊNCIA DO COMPORTAMENTO SOBRE DO CABELO.

Amanheceu uma segunda-feira com a temperatura amena, e seca, iniciando a última semana da estação de inverno. Normalmente a segunda-feira é considerada o dia da preguiça, ainda mais com a influência do clima. Logo que abro as portas da barbearia chega os clientes e também os amigos de bate papo diário, com sérios comentários sobre a rodada de futebol de domingo a tarde do dia anterior, e lá se vão crescendo as discussões sobre aquela jogada, o gol duvidoso, o pênalti não marcado, a expulsão incorreta. E tudo quanto é assunto que mantêm o calor no agrupamento da rodinha séria e fiel aos seus conceitos. Meu pai o barbeiro, entre uma de suas falas que contribuem para a sustentação do ambiente, a cada tesourada na mexa de cabelo, percebe que seu cliente sente ciúmes em não dirigir total atenção de rosto virado para ele na hora da fala. Nesse meio de tempo estou atendendo outro cliente que reclama de seu cabelo estar amassado e difícil de assentar, além da barba crescida de três dias aparentando mal humorado.
Passado aquele período da manhã, a aparência do cabelo não se assentar bem, repete com outras pessoas no período da tarde, com as mesmas reclamações, somente pelo simples prazer de reclamar. Chega a noite é hora de fechar a barbearia comento com meu pai sobre as queixas dos fregueses. Pela experiência de quarenta anos de tesoura, meu pai comenta calmamente:
__É assim mesmo no dia de folga, geralmente no fim de semana que a pessoa come muita comida pesada e gordurosa no parece que pesa no fígado, fazendo-lhe ficar mal. Parece que o cabelo acompanha o estado físico e emocional da pessoa, nessas condições dá mais trabalho para fazer aquele corte bem acabado.

4 - REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

DEAN, Warren. A Industrialização de São Paulo (1880 – 1945). Corpo e alma do Brasil, 4º edição, editora: Bertrand Brasil S. A. 1991.

DIÁRIO DE POÇOS DE CALDS. Jornal da cidade de Poços de Caldas, 09 de Junho de 1987, p. 05. E 10 de Abril de 1963, p.? (Arquivo da biblioteca da PUC de Poços de Caldas).

MOURÃO, Mário – Poços de Caldas Síntese Histórico Social. – Editora Saraiva S. A. São Paulo. 2º edição, 1952, p. 517; 518 e 550.

PRADO JÚNIOR, Caio. 1907. Formação do Brasil Contemporâneo: São Paulo: 23º edição, editora Brasiliense, 1999. Capítulo Organização Social, p. 269 – 377.

SEGUSO, Mário. “Os admiráveis italianos de Poços de Caldas, 1884 – 1915”, Capítulo 5. Os Italianos na cidade, 2º ed. p. 117-173 e 177.

OUTROS lançamentos do imposto de indústrias e profissões, Vida Social, Poços de Caldas, 02 jan. 1927, p.? (Arquivo da biblioteca do Museu histórico e Geográfico de Poços de Caldas).